O meu primeiro dia na escola foi o primeiro dia que me descobri gentil.
Tinha apenas quatro anos. Quase cinco, mas já podia freqüentar o jardim de infância, nível A, como diziam. Vesti o uniforme, peguei a merendeira, coloquei duas chiquinhas no cabelo e saí de casa como se estivesse pronta para o mundo.
Não me lembro se gostei. Só lembro de ter avistado uma moça bem bonitinha e simpática. Era a “tia”. Eliane era o seu nome. Ela era muito gentil. Sorria e cumprimentava a todos como se fossem velhos amigos. Então porque toda aquela choradeira, meu Deus? Havia um menino que já estava começando a me irritar... que escândalo!
Minha mãe segurava minha mão e já estava pronta para me deixar sair debaixo de suas asas. Eu faria novos amiguinhos, dissera-me em casa. Tudo bem, pensei, então eu vou!
A tia foi até a porta, onde estávamos. Seus cabelos dourados brilhavam e seus grandes olhos azuis sorriam para mim. Queria ser como ela, pensei. Gentil, como ela. Perguntou meu nome. Minha mãe respondeu:
-- É Ana Karina.
Ela então falou docemente:
-- Vamos entrar, Aninha?
E eu, de uma forma gentil, respondi:
-- Não gosto que me chamem de Aninha. Meu nome é KA-RI-NA! – e entrei.
Pois é, essa sou eu... Gentil, como ela...